A TRILOGIA BATMAN:

A CONSTRUÇÃO DO SUPER-HERÓI BATMAN

EM CONEXÃO COM O MITO DE PERSEU

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Batman HQ

 

 

BATMAN BEGINS

Direção de Christopher Nolan (EUA/2005)

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Batman/BruceWayne

O filme “Batman Begins” conta a história de Bruce Wayne (Christian Bale) e sua infância. Testemunha do assassinato de seus pais, quando criança, o milionário parte em busca da compreensão da mente dos criminosos para encontrar sentido para sua sede de vingança. Ele treina com mestres do Tibé, na China. Ao retornar ele encontra Gotham City dominada pelo medo e pela corrupção. Seu objetivo será o de salvar a cidade, combatendo o crime, mas precisa esconder a sua real identidade, na figura de um playboy milionário.

Raquel Dawes (Katie Holmes) é o seu amor de infância, agora ela é advogada distrital, que tenta salvar Gotham City, sitiada pelas drogas e dirigida por bandidos. No encontro com ele, depois de adultos, ela sente que aquela atração da infância volta e pode unir ambos na missão de salvar a cidade.

Bruce vê, nesta atração, o retorno de seu passado, provocando lembranças da infância que remetem aos seus pais. Rachel, portadora de uma beleza suave e serena representa, para ele, o resgate do amor e do afeto, sentimentos embotados e sufocados pela dor da separação repentina de seus pais, que tanto atormenta sua alma.

Alfred Pennyworth (Michael Caine), o mordomo, serve à família Wayne há muitos anos. Depois da morte dos pais de Bruce, ele criou o menino como seu próprio filho. O mordomo cuida da vida dupla de Bruce, bem como também atua como seu médico e assistente.

Lucius Fox (Morgan Freeman) era o braço direito do pai de Bruce nas empresas Wayne, mas é relegado a funções menores, depois da morte do amigo. Com a volta de Bruce, ele auxilia-o, construindo o batmóvel e a roupa que ele utilizará para o disfarce de Batman. Lucius é um executivo, responsável pelo setor de protótipos das empresas Wayne e especialista em armas.

O Tenente Gordon (Gary Oldman) é o único tira honesto na cidade.

O misterioso Henri Ducard (Lia Neeson) foi mentor de Bruce ensinando-lhe as lutas marciais, mas também era atormentado por sua mente assassina.

Outros vilões são Carmine Falcone (Tom Wilkinson) que comanda Gotham City no submundo do crime e o Dr. Jonathan Crane (Cillian Murphy), um psiquiatra do Asilo Arkham que começa a desenvolver substâncias que causam pavor nas pessoas. São peças importantes no conjunto dos vilões da cidade.

O filme apresenta uma interessante construção do super-herói das HQs. O personagem é centrado no Batman por trás da máscara, focado no homem e não no super-herói, o que me possibilitou estabelecer uma conexão deste personagem com o homem contemporâneo, numa ótica freudiana e também com o mito de Perseu, conforme meus comentários mais adiante.

A tragédia presenciada pelo pequeno Bruce que foi a morte dos pais, causou-lhe um profundo trauma (em grego significa ferida), que moldou sua personalidade. Ele tenta rejeitar a dor, mas não consegue. Então parte numa jornada de sete anos para entender a mente dos criminosos, para conhecer seus inimigos e posteriormente, derrotá-los.

Nesta busca, ele encontrou a si mesmo e percebe o quanto a raiva ainda o domina. Ele também adquiriu uma fobia por morcegos, devido ao fato de ter caído num buraco quando criança e foi salvo pelo pai.

Enquanto nos animais, o medo serve apenas para a sobrevivência, no homem, as lembranças guardadas no inconsciente e na imaginação, somam-se aos temores reais, tornando-se difícil a sua solução.

Bruce na batcaverna enfrenta os morcegos e usa o símbolo deste animal para a sua fantasia de Batman.

Ele é um homem sombrio, que passou por treinamentos em lugares distantes e sua personalidade ficou prejudicada, marcada pelo seu passado. Reveste-se de disfarces como de playboy (representando o social, o ego) e a roupa de morcego (cujo animal representava sua fobia, o lado negro de seu inconsciente).

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O vôo do homem morcego

Batman: o cavaleiro das trevas

Direção de Christopher Nolan (EUA/2007)

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Batman/Coringa

O filme Batman – o cavaleiro das trevas (EUA, 2007), com roteiro e direção de Christopher Nolan é estrelado por Christian Bale, Heath Ledger, Michael Caine, Aaron Eckhart, Gary Oldman, Morgan Freeman e Maggie Gylenhall.

O filme foi inspirado nas obras de Frank Miller (Batman – o cavaleiro das trevas) e de Alan Moore (A piada mortal). Este filme é a continuação de Batman Begins (2005), do mesmo diretor e está centrado na relação entre Bruce Wayne/Batman e seu inimigo mortal, o Coringa. Entre os dois, surge a figura de Harvey Dent, promotor distrital que utiliza a sua imagem a serviço da justiça, usando todos os recursos que possui para colocar ordem na cidade. E graças ao seu empenho contra o crime, ele se transforma em celebridade. Depois, ele se transforma no vilão Duas Caras.

 

O ALUCINADO CORINGA

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Coringa

Outro vilão é o alucinado Coringa, que só quer instalar o caos, subvertendo a ordem na cidade. Ele reúne um exército de bandidos mascarados para provocar uma onda de violência e para combater Batman.

A sua lógica (se é que ele possui alguma) é que o homem-morcego deve ser eliminado, mas ele descobre que o seu inimigo dá sentido à sua existência. Com suas roupas extravagantes, gargalhada sinistra, rosto deformado e muito sadismo, ele compõe este personagem perturbador.

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Coringa mascarado

O ator Heath Ledger, falecido em janeiro de 2008, baseou a construção de seu personagem em Alex/Malcolm McDowell do filme Laranja Mecânica, do diretor Stanley Kubrick (1971).

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Heath Ledger

O ator revela uma excelente performance e nos dá a noção da maldade e loucura de seu personagem, considerando que não distingue a realidade da insanidade, ele queima até dinheiro.

O diretor diz que não reinventou o personagem do Coringa, apenas foi buscar suas origens nos anos 40. (Revista SET - julho de 2008)

Em O Cavaleiro das Trevas, este personagem é um misto de masoquismo e humor negro que ganha uma nova dimensão a partir da sua relação com Batman, que é de despeito e escárnio. Ele diz: “Você me completa”. Esta frase do Coringa dirigindo-se a Batman, nos revela a dualidade do palhaço do crime, que reconhece as ações nobres do seu inimigo, entrando em contradição.

Batman à luz de Freud

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Batman e Sigmund Freud

Sigmund Freud nasceu em 1856 e estudou medicina em Viena e se especializou em Neurologia. Posteriormente, fundou a Psicanálise, que objetiva o estudo da mente, da psique humana em geral, quanto um método de tratamento para distúrbios nervosos e psíquicos.

Freud através de seus estudos detectou que havia um conflito entre o homem e aquilo que seu meio exigia dele, descobrindo assim, o universo dos impulsos que regem a vida do homem. E estes impulsos podem dominar nossa razão e nem sempre a razão governa nossas ações. Os impulsos irracionais determinam nossos pensamentos, sonhos e ações, sendo capazes de trazer à luz instintos e necessidades que estão profundamente enraizados dentro de nós, como exemplo, o impulso sexual do homem. Estas necessidades podem vir disfarçadas, impossibilitando assim o seu reconhecimento. Assim disfarçadas elas governam nossas ações.

O trauma psíquico foi descoberto pela primeira vez por Sigmund Freud, como o afluxo de excitações excessivas em relação à capacidade do indivíduo de dominá-las e elaborá-las. Atualmente se considera que traumas psicológicos podem afetar a qualidade de vida das pessoas com grande impacto, caracterizando-se no transtorno de stress pós-traumático (TEPT) e se manifestando por recordações aflitivas, pensamentos indesejáveis recorrentes, estado de alerta, ansiedade, insônia, entre outros sintomas. (Revista Viver Mente & Cérebro – outubro de 2005)

Bruce Wayne sente-se culpado e com raiva e deseja agredir o inimigo. Os impulsos irracionais querem governar a sua mente e determinam os seus pensamentos, os seus sonhos e as suas ações, sendo capazes de trazer à luz os seus instintos agressivos e as necessidades que estão profundamente enraizadas dentro dele. Para reconhecê-las será necessário que Bruce deixe as portas abertas do seu consciente e inconsciente para receber o material psíquico na sua mente e elaborá-lo, eliminando assim, o desgaste e o sofrimento provocados pela sua neurose. E para ele obter este processo psíquico com sucesso, paga-se um alto preço. Bruce, ao presenciar a morte dos seus pais, quando saíam do teatro após o término de um espetáculo, não pode combater o assaltante que levou as joias de sua mãe. O pai e a mãe foram baleados vindo a falecer. E neste momento, o menino internalizou a culpa por não ter salvo os pais, vinculando-a aos seus sentimentos e criando em si o caráter neurótico.

Segundo Freud, o caráter neurótico representa a incapacidade de adaptação às situações e gera a angústia no homem. A civilização nega ao indivíduo uma completa gratificação instintiva, mas essa negativa era necessária ao progresso da civilização e formadora da cultura.

 

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Freud

 

Bruce/Batman desenvolveu alguns sintomas neuróticos que interferem na sua vida. Ele trava uma luta incessante entre o seu consciente (ego) e o seu inconsciente (seus instintos/impulsos), gerados pelo seu sentimento de culpa.

Freud afirma que o sentimento de culpa conflita com os mecanismos de representação dos desejos individuais do homem, favorecendo nele a vivência constante deste sentimento. A substituição do poder individual pelo poder de uma comunidade é a saída encontrada, sendo o passo decisivo da civilização. Sua essência reside no fato de os membros da comunidade garantirem que uma lei, uma vez criada, não pode ser violada em favor de um único indivíduo.

Batman em Gotham City simboliza a lei, a justiça e a ordem, tendo que sacrificar seus instintos de vingança e interesses particulares em prol do bem-estar da cidade. Ao renunciar aos seus instintos e desejos, que lhe são atribuídos naturalmente, então só lhe resta a sublimação destes desejos. A sublimação do instinto constitui um aspecto particularmente evidente do desenvolvimento cultural, tornando possíveis as atividades ideológicas, como no caso de Bruce. Ele desempenha um papel importante na vida da cidade, ao proteger seus habitantes contra os bandidos. Desta forma, ele sublima seus impulsos agressivos.

Segundo a teoria freudiana a liberdade do indivíduo não constitui um dom da civilização, mas sim, é o preço que se paga para o homem poder viver coletivamente e culturalmente. A civilização impõe sacrifícios hercúleos ao homem, não apenas relacionada à sua sexualidade e suas restrições, mas também à sua agressividade e pode-se deduzir como é difícil ser feliz na nossa civilização ou mesmo em Gotham City.

Ao recorrer à Freud, para o entendimento destes impulsos irracionais que querem dominar nosso herói percebi a sombra do homem contemporâneo que se delineia sobre a figura de Batman.

BATMAN O CAVALEIRO DAS TREVAS RESSURGE

Direção de Christopher Nolan (EUA/2012)

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Batman/Bruce Wayne

O filme “Batman – o cavaleiro das trevas ressurge” é estrelado por Christian Bale, Michael Caine, Morgan Freeman, Anne Hathaway, Marion Cotillard, Tom Hardy entre outros atores.

O milionário Bruce Wayne, nesta versão de Nolan, está recluso em sua mansão e pronto para a aposentadoria. O herói não é visto desde que assumiu a culpa pelos crimes de Harvey Dent, promotor de justiça da cidade e morto num incêndio.

As empresas Wayne entram em falência em consequência da fusão com as empresas de Miranda Tate, uma executiva que investe em pesquisas sobre ecologia ambiental.

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Lucius (Morgan Freeman) e Miranda Tate (Marion Cotillard)

 

Em uma festa no jardim da mansão Wayne que foi emprestada aos policiais da cidade, Bruce assiste a tudo sem aparecer na confraternização.

Enquanto isso, num dos quartos da mansão Wayne Bruce se depara com Selina Kyle, uma ladra astuta que se fantasia de mulher gato para roubar as digitais do milionário e assaltar seu cofre para levar um colar de pérolas da família.

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Mulher gato ( Anne Hathaway)

As digitais de Bruce são vendidas ao líder de uma gangue que provoca vários tumultos na cidade, na tentativa de destruir Gotham e também o herói da máscara negra, que protege a cidade.

Bruce Wayne percebe a periculosidade de Bane (Tom Hardy) e retorna ao trabalho, com suas roupas de super-herói, para acertar as contas com o “grandalhão”.

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Bane (Tom Hardy)

Eles travam uma luta “no muque” e Batman acaba ferido, com suas costelas quebradas e enviado para uma prisão distante, dirigida por Bane.

Ao longo dos meses, Bruce encarcerado tenta se reabilitar fisicamente e mentalmente para derrubar o inimigo. Com a ajuda dos prisioneiros ele foge e retorna a Gotham para continuar a sua saga.

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Batman e a Mulher Gato

Batman e o Mito de Perseu

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Perseu - obra de Tiepolo

Um herói é definido como valente, justiceiro, prestativo, inteligente e enigmático, cujas características são semelhantes da personalidade de Bruce/Batman e que também encontrei no mítico Perseu.

Vou relatar aqui a lenda de Perseu e da Medusa, baseada na versão do autor Roberto Carvalho de Magalhães, para posteriormente estabelecer uma conexão entre os dois personagens.

Acrísio, rei de Argos, tinha ido a Delfos para consultar o famoso oráculo de Apolo, que lhe predisse a profecia segundo a qual seria possível a vinda de um menino ao mundo e que teria como consequência o assassinato do seu pai ou do avô. Como o rei de Argos tinha somente uma filha e para fugir a tal profecia, Acrísio encerra a sua filha Dânae num aposento subterrâneo de bronze, construído sob o pátio do seu palácio, a fim de evitar que ela pudesse engravidar e ter um filho, o qual iria matá-lo mais tarde.

Mas isso não bastou para impedir que Zeus, arrebatado pela beleza da jovem, penetrasse na câmara, na forma de uma chuva de ouro e a fecundasse.

Com a cumplicidade de sua ama, Dânae dá à luz a um menino, que é chamado de Perseu e o mantém escondido do avô.

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Danae – obra de Corregio

Acrísio, contudo, descobre o ocorrido e, não querendo acreditar na versão da filha, que afirmava ter sido seduzida por Zeus, encerra-a com o menino numa arca e abandona-os no mar, para livrar-se do neto e do risco de ser morto por ele.

A arca vai dar na ilha de Sérifo, onde os dois náufragos são recolhidos pelo pescador Díctis, irmão de Polidectes, o tirano local.

Díctis hospeda Dânae em sua casa e cria o menino. Enquanto isso, ele havia comentado o seu desejo de que não via a hora de possuí-la.

Mas Perseu, que se tornara um jovem muito belo e forte, mantinha a guarda cerrada em torno da mãe. Polidectes inventa um estratagema para distrair Perseu e convida-o, junto com outros amigos, para um jantar e pergunta a eles o que pretendem lhe oferecer como presente de seu casamento com Hipodâmia. Todos respondem que o presente adequado a um rei era um cavalo.

Perseu, criado por um pescador, não podia fazer a mesma oferta e diz que, se Polidectes assim o desejasse, iria trazer-lhe a cabeça da Medusa, uma das górgonas, que transforma em pedra quem as contempla.

O tirano aceita a oferta de Perseu, que parte imediatamente, em busca do monstro. Mas ele era filho de Zeus, que nunca iria deixar que seu filho morresse. Assim, ordenou aos deuses Atena e Hermes para auxiliá-lo na sua missão.

Hermes presenteou Perseu com a única espada que poderia cortar de uma só vez a cabeça da terrível Medusa. Enquanto Atena deu a ele um escudo tão reluzente que podia servir de espelho. Depois, o herói recebe também as sandálias aladas das ninfas, com as quais ele poderia voar e o capacete de Hades (deus dos mortos), que o tornaria invisível; também ganhou o saco mágico para colocar dentro a cabeça do monstro. Esta, mesmo depois de decepada, ainda tem o poder de transformar em pedra quem olhar para ela.

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Perseu e as ninfas

Perseu logo que apanhou os apetrechos, partiu. Quando ele chegou à ilha das górgonas ele se lança sobre Medusa, decapitando-a, enquanto a mesma dormia.

Do pescoço da Medusa saem os dois seres gerados pela união dela com Poseidon, o cavalo alado Pégaso e Crisaor, o homem da espada de ouro.

Ao retornar para casa, Perseu passou pela Etiópia, onde reinava Cefeu e descobriu que Andrômeda, a sua filha, havia sido exposta como presa de um monstro marinho. De fato, Cassiopéia, a esposa de Cefeu, ousara desafiar as Nereidas (deusas do mar) a uma competição de beleza, vangloriando-se de ser a mais bela de todas. As Nereidas sentiram-se ofendidas e foram reclamar a Poseidon que se enfureceu e mandou uma inundação para devastar todo o território e enviou também o monstro marinho que nadava ao redor da moça, a fim de devorá-la.

Perseu logo que avistou Andrômeda acorrentada numa rocha, se aproxima da moça e ouve a sua triste história:

Meu nome é Andrômeda e sou filha de Cefeu, rei deste país. Fui amarrada à rocha, pobre de mim, porque preciso pagar por um delito que não cometi! Minha mãe, a rainha Cassiopéia, cometeu um erro terrível, quis medir em beleza com as belíssimas Nereidas, filhas de Nereu, o adivinho do mar. E não foi só isso, pois no final ela brigou com elas, insistindo que era a mais bela de todas”.

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Andrômeda presa nas rochas

Perseu ficou imediatamente comovido e já estava apaixonado pela linda moça e queria muito salvá-la para fazer dela sua mulher. Então, ele matou o terrível monstro do mar.

Depois, o herói após assegurar-se de que a fera estava mesmo morta, soltou as correntes que prendiam Andrômeda às rochas, tomou-a cuidadosamente nos braços e foi deixá-la sobre terra firme, junto a seus pais, que a abraçaram e choraram de emoção.

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Andrômeda e Perseu

No dia seguinte, preparam-se as núpcias no grande salão do palácio e todos se reuniram para comemorar o casamento de Perseu e Andrômeda. Mas, a moça estava prometida ao seu tio Fineu, que surgiu de repente para destruir a festa. Perseu usou a cabeça da Medusa contra os homens de Fineu que iam caindo mortos pelo chão, mas ele trazia consigo um exército inteiro e a luta era ainda muito desigual, pois caíram também os companheiros de Perseu.

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Perseu enfrentando os inimigos

Por último restou o próprio Fineu, que, ao ver o mal que se abatera sobre seus companheiros, caiu apavorado aos pés de Perseu e implorou que tivesse compaixão. O herói, no entanto, mostrou-lhe na hora a cabeça da górgona e o transformou em pedra. Assim, Fineu ficou petrificado na posição mais humilhante, a do guerreiro que suplica que lhe poupem a vida.

Perseu desposou Andrômeda, mas não quis prolongar sua permanência no palácio de Cefeu, pois precisava voltar para casa e partiu com a esposa. Quando chegaram a Séfiros, Perseu foi primeiro à procura de sua mãe e soube que Polidectes a mantinha prisioneira. Viu-o em um terraço ao lado do palácio, a beber, comer e farrear com os amigos. Mal surgiu Perseu, todos ficaram embasbacados. E para se vingar do tirano, o herói usou a cabeça da Medusa transformando todos em pedra.

Depois de libertar a sua mãe, fez de Díctis rei da ilha e em seguida, juntamente com Dânae e Andrômeda, voltou para Argos. Assim que chegou, agradeceu a deusa Atena, que tanto o havia ajudado e ofereceu a ela a cabeça da Medusa. A deusa aceitou e pôs a oferenda em sua égide (couraça-escudo feita por Zeus com a pele da cabra Aix).

Depois, o herói tomou o rumo das ninfas e devolveu as sandálias aladas, o capacete de Hades e a sacola mágica.

Perseu queria rever o avô, Acrísio, o qual tendo sabido de sua iminente chegada, refugiou-se em outro país. Lá ocorre um evento do qual Perseu participa e arremessa o disco, golpeando involuntariamente um dos pés do avô, que está camuflado em meio ao público, provocando a morte dele. E assim se realiza o oráculo de Delfos.

Desconsolado pelo acontecido, Perseu não ousa reclamar o reino, que era seu de direito e troca-o pelo de Tirinto, do qual era rei seu primo Megapentes.

O herói construiu uma bela cidade chamada Micenas, onde viveu uma longa vida com sua família.

O herói começou tentando salvar a sua mãe, mas acaba recebendo muito mais. Ele corresponde ao amor materno, arriscando sua própria vida, auxiliado pelos deuses para poder enfrentar a Medusa. E utiliza com sensatez e modéstia a sua força. Depois de executar a Medusa ele oferece a cabeça desta como presente a Atena, que tanto o auxiliou. A deusa deu a Asclépio dois frascos do sangue de Medusa. Venerado como o fundador da medicina, Asclépio era habilidoso na cirurgia e no uso de remédios. Ele usou o sangue do lado esquerdo de Medusa para levantar os mortos; o sangue do lado direito que provocava a morte instantânea.

O mito da Medusa

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Medusa - Caravaggio

O fato de o sangue de Medusa poder tanto curar como de matar demonstra que a figura da Medusa não era estritamente negativa e destruidora, tendo em si as forças curativas positivas, o que lhe dava equilíbrio, segundo a autora Marta Robles. (2006)

A autora acrescenta ainda que, desde a sua origem a Medusa simboliza o inimigo que deve ser vencido. Reinterpretadas ao longo do tempo as górgonas evocam as deformações da consciência consideradas, em Psicanálise, pulsões pervertidas.

Para o autor Adam McLean, podemos vê-las como figuras guardiãs, protetoras das fronteiras dos antigos mistérios primais, guardiãs do limiar. O autor cita Robert Graves, entre outros e sugere que as sacerdotisas usavam na celebração dos Mistérios, máscaras de górgonas para afastarem os não iniciados. Cabeças de górgonas, na forma de grotescos entalhes eram colocadas com frequência nos muros das cidades gregas para aterrorizarem os inimigos. (1999)

Medusa é um dos monstros da mitologia clássica mais figurada na história da arte. E na arte moderna ela só conserva a cabeleira de serpentes, numa demonstração de que o uso da mitologia na arte não tem um fim exclusivamente ilustrativo, mas sim é livre e, com frequência até contradiz as fontes antigas. (Magalhães, 2007)

A meu ver, a Medusa simboliza as pulsões, o mundo arcaico (o inconsciente) e a inveja, a agressividade, são serpentes na nossa cabeça. A górgona pode simbolizar também o outro no homem (o seu duplo), o seu caos, a sua deformidade, o seu “Coringa”.

O olhar da Medusa que petrifica gera o medo traduz a difícil elaboração de conflitos internos. Julgo que ela possui a bipolaridade do bem e o mal, são dois lados de uma mesma moeda, simbolizando a duplicidade deste mito e do comportamento humano.

A monstruosidade do vilão Bane é a mesma da Medusa e o sadismo do Coringa resulta numa destrutividade que gera a violência. A mesma monstruosidade facial do Coringa se assemelha ao olhar petrificador da górgona.

Narra Hesíodo em sua Teogonia que, quando Perseu cortou a cabeça da Medusa, brotando o imenso Crisaor e Pégaso, o animal abandonou a terra em pleno vôo e foi para junto de Zeus, auxiliando-o a carregar o raio e o trovão.

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O nascimento de Pégaso e Crisaor

O cavalo alado Pégaso e o guerreiro Crisaor, com uma espada de ouro na mão, surgem completamente desenvolvidos. Eles são filhos gerados de Poseidon e Medusa, no templo de Atena.

Crisaor pode significar as pulsões aprisionadas (monstros dentro de nós). Enquanto que, Pégaso, o cavalo alado simboliza a imaginação criativa ou a espiritualidade do ser humano e possibilidades de transformação.

Ambas as narrativas contam a morte de entes queridos que gera a culpa e a agressividade. Mas, nossos heróis também sabem sublimar fazendo o bem. Se considerarmos a possibilidade da Medusa simbolizar o outro no homem, Perseu conseguiu harmonizar o seu interior ao decapitá-la, isto é, trouxe para seu consciente suas energias destrutivas e obteve a fortificação de seu ego. E quando ele se apaixona é destemido, considerando que Andrômeda (como Rachel) está prometida para outro homem. Ele protege a amada contra os inimigos e também luta pelo seu amor.

O herói pega a cabeça da Medusa e salva Andrômeda do dragão, restituindo-a aos seus pais. O monstro com cabeça de javali simboliza as forças negativas, tanto quando a Medusa.

O nome de Perseu significa “destruidor” e descreve seu papel de matador de Medusa, mas Acrísio só vê essa destruição em relação a si mesmo.

Esta narrativa de luta e sacrifício se inicia pelo medo. Mas o herói é hábil e corajoso ao eliminar a górgona. Ele perdoa Acrísio, por não ser vingativo e rancoroso. Sua história é de amor e de coragem, que vence o medo e o ódio e reflete o modo como o divino está presente em toda a sua criação. (Greene, 2001)

Simbolicamente, Perseu ao entrar em contato com seu lado obscuro (Medusa/inconsciente), descobre o tesouro que guardava dentro de si, a sua força interior. Este mito retrata a batalha íntima que o homem trava para enfrentar seus medos e reencontrar a si próprio. Ele também simboliza o novo e que traz a transformação, pois conseguiu harmonizar dentro de si a sua consciência ao enfrentar a Medusa, mesmo usando seus disfarces.

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Cabeça da Medusa

Perseu também apresenta características de duplicidade, na medida em que precisa de disfarces e de auxílio dos deuses para combater a górgona, sem ser reconhecido. É a forma que ele encontra para realizar com sucesso a sua tarefa de decapitar a Medusa. Os instrumentos que utiliza no combate ao monstro são importantes porque ocultam a sua verdadeira identidade, a fim de realizar o bem contra o mal.

Enquanto o personagem do HQ foi criado em 1939 e trata-se inicialmente de um herói de Histórias em quadrinhos.

Os super-heróis do cinema sempre me atraem por sua força e a obstinação de ajudar as pessoas, geralmente, de uma grande cidade. Eles costumam ter muitos aliados e carregam muitas armas. Mas, o meu preferido é Batman. Ele é um homem muito rico, que sofreu grandes perdas na vida e na trilogia (os três últimos filmes dirigidos por Nolan), Batman, continua combatendo o crime, mas escondendo a sua real identidade, na figura de playboy e milionário. As características psicológicas de Batman como a autoconsciência no processo mental possibilita que o herói possa dizer: “eu sou eu, independente da roupa ou dos disfarces que utilizo para atingir meus objetivos”.

Bruce Wayne protege as pessoas e com isso conduz à resolução do seu conflito individual porque ele percebe que sua missão é a de servir simplesmente.

Ele é o mais humano dos super-heróis, não tem nenhum super-poder, tanto quanto Perseu. Eles também só castigam aqueles que merecem punição. Acrescento a isso, o que os torna parecidos são os impulsos humanos que os levam, por forças dos instintos mais sombrios, a tentarem transformar estes impulsos ou instintos agressivos em algo positivo.

O personagem Batman de Nolan se diferencia dos outros das filmagens anteriores, pois se trata de um herói muito mais próximo do ser humano, com sua face dualista e mais atual do que nunca.

“Ou você morre herói ou vive o bastante para se tornar o vilão. Posso ser os dois. Sou o que Gotham quer que eu seja.” (Batman)

Referência bibliográfica:

1) CABRERA, Julio. O cinema pensa: uma introdução à filosofia através dos filmes. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.

2) CIRLOT, Jua-Eduardo. Dicionário de Símbolos. São Paulo: Centauro, 2005.

3) GREENE, Liz. Uma viagem através dos mitos: o significado dos mitos como um guia para a vida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

4) JONES, E. Obras Completas de Sigmund Freud. São Paulo: Imago, 1989.

5) MAGALHÃES, Roberto Carvalho de. O grande livro da mitologia: a mitologia clássica nas artes visuais. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007.

6) MCLEAN, ADAM. A deusa tríplice – em busca do feminino arquetípico. São Paulo: Cultrix, 1989.

7) ROBLES, Martha. Mulheres, Mitos e Deusas: o feminino através dos tempos. São Paulo: Aleph, 2006.

8) Revista VIVER MENTE & CÉREBRO – outubro de 2005

Imagens:

sites:

www.adorocinema.com.br

www.google.com.br

Livros:

Alan Moore – A Piada Mortal – quadrinhos

Livro de Ouro da Mitologia – Thomas Bulfinch

Filmografia:

Batman Begins, Christofer Nolan, 2005.

O cavaleiro das trevas, Christofer Nolan, 2007.

Batman - o cavaleiro das trevas ressurge, Christofer Nolan, 2012

 

Rosângela D. Canassa

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