Análise do filme VINHAS DA IRA: o homem é o lobo do homem

clip_image002

A família Joad

O filme As Vinhas da Ira, de 1940, baseado no romance de John Steinbeck, narra a história de Tommy Joad (Henry Fonda) que retorna à sua família, depois de ser condenado a sete anos por homicídio. Ele sai da prisão em liberdade condicional, depois de cumprir pena de quatro anos.

Ele mora em Oklahoma e quando chega em casa, ele não encontra sua família, porque estão todos morando na casa de seus tios, segundo o seu vizinho.

Tommy vai até a fazenda dos tios e encontra todos fazendo as malas e se preparando para a grande jornada, até a Califórnia. A família Joad foi expulsa de sua própria terra, depois de morar lá por mais de 50 anos. O terreno foi vendido para uma empresa que eles desconhecem, em plena crise da depressão, nos EUA.

Os personagens principais são todos de uma mesma família, os Joad são pequenos agricultores que, por causa da seca e da crise, deixam Oklahoma e percorrem estradas em busca de uma vida melhor na Califórnia. O livro teve enorme repercussão e valeu ao autor, John Steinbeck, o prêmio Pulitzer, em 1940. (Mente&Cérebro, 2007, p. 98)

 

clip_image004

A família Joad

A grande depressão ocorreu no período após a quebra da bolsa de Nova Iorque, em 1929 e como consequência, muitas pessoas perderam o emprego, suas terras e o crédito no banco. O filme mostra como milhares de cidadãos dos Estados Unidos fizeram viagens para vários lugares, saindo de suas propriedades em busca de colheitas de frutas ou de algodão, para trabalhar, em troca de um salário e de um teto para dormir.

O filme de Ford não tenta enfraquecer a mensagem do livro ou representa-lo dentro de uma forma hollywoodiana. Tommy ainda é o mesmo herói com defeitos, culpado de assassinato e longe da perfeição. (Vários autores, 2009, p. 115)

 

clip_image006

Ma Joad (Jane Darwell) e Tommy Joad (Henry Fonda)

O diretor John Ford conhecido como grande diretor do Western inicia a sua carreira em 1917, na Universal, com o curta The Scrapper e dirige Crepúsculo de uma raça (1964), seu último Western. Seu primeiro longa-metragem Straight shooting (1917) tornou-se um sucesso imediato. (Mascarello, 2006, p. 168)

O diretor também creditado como Jack Ford, nascido com o nome de Sean Aloysius O´Ferarna ou John Martin Feeney, foi um cineasta dos Estados Unidos da América de grande renome, do período de 1930 a 1960, conhecido, principalmente, mas não só, pelos seus westerns. Ford dirigiu os seguintes filmes: No tempo das diligências, A mocidade de Lincoln, Rastros de Ódio (com John Waine), que são sempre citados ou evocados em outros filmes. O ator mais importante na filmografia de John Ford é John Wayne, que foi transformado em estrela de Hollywood.

O cineasta ganhou o Oscar de melhor direção com o filme As Vinhas da Ira, em 1940 e também o Globo de Ouro especial em 1955, em reconhecimento ao seu pioneirismo na indústria do cinema americano.

O produtor do filme As Vinhas da Ira é Darryl F. Zanuck que exigiu um final positivo, diferente do romance e a incansável matriarca Ma Joad, vivida com perfeição por Jane Darwell, reafirma a força e a dignidade do espírito individual. (Bergan, 2007, p. 417)

clip_image008

Russel Simpson (Pa Joad), Jane Darwell (Ma Joad) e

Henry Fonda (Tommy)

No cinema universal alguns cineastas foram caracterizados por representar preferencialmente o que poderia se chamar “o lado sombrio” do ser humano e da vida, e uma visão cética dos valores, seja através do drama, seja através da paródia, mostrando o lado grotesco e ridículo da vida humana. (...) Por outro lado, existem diretores que preferem focar o lado luminoso do ser humano, seu heroísmo, sua capacidade de ser generoso e solidário, sua capacidade de amar e de ajudar outras pessoas, através de personagens fortes, saudáveis e heroicos ou que, pelo menos, observam as fraquezas do ser humano com poesia, tolerância e um pouco de piedade. Alguns deles é o diretor John Ford. (Cabrera, 2007, p. p. 237)

No início da viagem até a Califórnia os personagens percebem que nada será como antes, porque sofrerão uma transformação profunda na vida. Eles também negam a si mesmos, qualquer possibilidade de mudança, como sendo um fator favorável.

O pessimismo que os personagens sofrem durante o filme pode ser representado pela fotografia cinzenta, com paisagens extremamente sombrias, como as almas daqueles sitiantes que perderam tudo por causa da crise e da seca.

clip_image010

                                         Paisagem

Para o filósofo alemão, Artur Schopenhauer (1788-1860), a vontade humana se caracteriza pela contínua luta entre suas diversas formas. (...) vemos em toda a natureza luta, guerra e alternativas na vitória, no qual temos que reconhecer o desdobramento essencial operado no seio da vontade.(...) Pela natureza inteira podemos seguir esta luta, porque, no fundo, o mundo consiste nela (...). Esta luta cósmica alcança seu máximo de visibilidade no mundo animal, cuja nutrição é constituída pelo reino vegetal, no qual cada animal é butim e alimento de outro, isto é, a matéria em que sua ideia se reflete deve servir para a manifestação da ideia de outro enquanto cada animal só pode conservar a sua existência pelo constante sacrifício de outra existência, de modo que a vontade de viver se devora constantemente e em diferentes formas é seu próprio alimento, até que, por fim, a espécie humana, como superior às demais, considera o mundo uma imensa fábrica para seu uso, e (...) o gênero humano encarna aquela luta, aquele autodesdobramento da vontade, com a mais terrível violência, em que o homem chega a ser o inimigo do homem: homo homini lúpus. (Cabrera, 2007, p. 258-259)

Para o filósofo, o homem é o lobo do homem e a vontade de viver é cega, sem finalidade última. Tudo possui vontade, mas no homem esta se dá sob uma forma particularmente dolorosa, já que suas intenções e ações oscilam da dor da ansiedade ao fastio da satisfação e vice-versa. Neste vaivém irrefreável, se baseia o famoso pessimismo estrutural e não meramente empírico, como às vezes interpreta o filósofo. (Cabrera, 207, p. 236)

A ideia de Schopenhauer em relação à vontade do homem é bastante pessimista, porque ele considera que só a vontade não basta, o homem quer viver, mas não tem saída, já que é butim de outro homem.

 

clip_image012

Cartaz do filme

 

Já Cabrera encontra nas vicissitudes algo positivo, sendo que o homem pode se conhecer por meio da dor e da riqueza da negação (...) Os lugares que os personagens atravessam e o tempo que se “gasta” viajando são constitutivos, transformadores. A vida é uma viagem enriquecedora e autoconscientizadora. (Cabrera, 2006, p. 217-222)

Segundo este autor, a viagem dentro de um filme pode ter a conotação de experiência e como consequência, uma transformação interior dentro do personagem. Além do deslocamento físico ele parte também para uma viagem interna, para conhecer a si mesmo, numa jornada interior.

No filme As Vinhas da Ira, a maior parte da história se desenrola na estrada, que é um elemento importante no filme, porque promove uma possibilidade para a família Joad, de encontrar um lugar onde possam viver e dar continuidade ao trabalho na agricultura.

O título do filme As Vinhas da Ira entendo como uma metáfora do verde vale da Califórnia, onde há produção de uva e que representa o alimento, o trabalho e a esperança, numa época tão difícil naquele país.

A road fiction, a ficção de estrada é uma jornada por rodovias que transforma-se num experiência transformadora, capaz de mudar a vida dos personagens. E em Vinhas da Ira, a jornada da família Joad pelas estradas, nos revela que isso é possível se esta for a direção escolhida, pela mudança.

A pé e com o coração leve, eu tomo a estrada aberta/

sadio, livre,

o mundo diante de mim/

a longa vereda diante de mim,

levando-me para onde quer que eu escolha”.

(Walt Whitman, poeta americano)

Referência bibliográfica:

1) BERGAN, Ronald. Guia ilustrado Zahar cinema. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed, 2007.

2) CABRERA, Julio. O cinema pensa: uma introdução à filosofia através dos filmes. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.

3) MASCARELLO, Fernando. História do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2006.

4) Revista Mente&Cérebro – 2007.

5) 501 Filmes que merecem ser vistos (vários autores). São Paulo: Larousse do Brasil, 2009.

Imagens/livro:

Dressed a century of Hollywood costume design – Deborah Nadoolman Landis – New Yok, Collins Ed., 2007

Ficha técnica:

Título: Vinhas da Ira

Direção: John Ford

Ano: 1940

País: EUA

Figurino: Gwen Wakeking

Elenco: Henry Fonda, Jane Darwell, John Carradine, Charley Grapewin, Dorris Bowdon, Russel Simpson e Zeffie Tilbury.

Premiações Oscar de 1941: melhor diretor, John Ford e melhor atriz coadjuvante, Jane Darwell.

Comentários

Postagens mais visitadas