Em Cartaz - Crimes do Futuro

Crimes do Futuro

Crimes of the Future




Mesmo quando produzem uma obra aquém de seus trabalhos anteriores, grandes diretores normalmente apresentam filmes que chamam a atenção de alguma forma, seja pela sua temática, estética ou design de produção. É o caso de Crimes do Futuro (2022), com problemas de ritmo que tornam o filme chato em muitos momentos, mas onde podemos assistir Cronenberg revisitando sua fascinação pela carne e máquinas biológicas, em uma fantasia sobre o futuro da humanidade.

A premissa básica de Crimes do Futuro narra uma realidade onde novos órgãos surgem nas pessoas, como uma forma de reação ao ambiente cada vez mais sintético. Acrescenta-se a isso a recém adquirida ausência de dor que se manifesta em alguns desses indivíduos, permitindo que a extração desses novos órgãos seja executada de forma pública, como em uma performance de body art – há outras performances extremas de body modification no filme, possíveis pela ausência de dor e que podem chocar alguns. As cirurgias executadas para a retirada dos órgãos são análogas a relações sexuais, mesma analogia feita com as bio-portas de eXistenZ (1999), também de Cronenberg: “cirurgia é o novo sexo”. E tudo isso pode ser uma metáfora do entorpecimento da sociedade atual, que não se abala com acontecimentos bárbaros que são noticiados todos os dias – ausência de dor – e os jovens que fazem cada vez menos sexo – mais interessante a espetacularização da vida privada nas redes sociais.

Ao contrário do que estamos acostumados, o progresso tecnológico em Crimes do Futuro não é a evolução tecnológica maquinal, mas sim a biológica genética. Isso é explicitado com a mesa de cirurgia e a cadeira de alimentação, os dois dispositivos aparentando serem vivos, orgânicos.

Alimentação automática: tecnológica maquinal (Chaplin) X biológica genética (Cronenberg)


A partir de agora tratarei de spoilers relevantes de Crimes do Futuro, prossiga por sua conta e risco.

Levando aos limites a teoria da evolução de Darwin, os humanos de Crimes do Futuro evoluem seu sistema digestivo para processar plástico, ou seja, seria possível comer todo esse derivado do petróleo que entope o planeta e que a natureza não consegue decompor de forma eficiente. Comer plástico não só poderia salvar a Terra de uma parte relevante da poluição como também tornar as pessoas imortais, afinal você é o que come.
Ou como cantou a banda Titãs “As flores de plástico não morrem”, porém elas não têm cheiro, gosto ou sentem qualquer coisa. A total apatia é o preço a se pagar pela imortalidade.


Nota: 4/5



Fabio Consiglio

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