Um filme por dia 2017 - 02/10 - Mãe! (2017)



Título original: Mother!
Pode-se não gostar dos filmes de Darren Aronofsky mas é impossível ficar indiferente a eles. Mãe! não é exceção e assisti-lo é uma experiência intensa, visceral, até desagradável em alguns pontos. Durante a projeção há momentos em que você odeia Mãe!, mas acabado o filme quanto mais você pensa nele mais você o admira.
A direção de Aronofsky é de tal forma competente que todo o desconforto sentido por Mãe (Jennifer Lawrence) é compartilhado pela plateia, em cenas sufocantes com closes fechados de forma claustrofóbica, intensificando o sentimento de angústia. A estória do casal que tem a sua pacata vida atormentada por estranhos, e cada vez mais numerosos, convidados indesejados é apenas uma alegoria de algo bem maior e para falar disso é necessário revelar spoilers e interpretar a obra de uma forma que pode estragar a experiência de quem ainda não a assistiu, portanto se você ainda não viu Mãe! não leia o texto abaixo.




Mãe! não é um filme de terror, apesar de algumas características que possam levar a essa conclusão, como a casa aparentemente assombrada e os acontecimentos que não parecem ser naturais. Na verdade Mãe! é uma fábula sobre a criação e destruição divinas, segundo a ótica católico-cristã. O personagem Him ou Ele (Javier Bardem), o marido de Mãe, na verdade é Deus como visto na Bíblia e Mãe é a encarnação do feminino, podendo ser vista como a mãe natureza, como a Virgem Maria ou mesmo como a representação das mulheres oprimidas pela cultura patriarcal judaico-cristã. O Deus ilustrado no filme é vaidoso e omisso, importando-se apenas com a adoração e a admiração pela sua obra. Mãe é mantenedora, totalmente ausente de vaidade, querendo apenas manter a sua casa - ou a natureza, o planeta, o universo - intacta e livre da destruição causada pela obra dEle, os homens. Vários personagens bíblicos desfilam na tela, como Man ou Homem (Ed Harris) que seria Adão e sua esposa Woman ou Mulher (Michelle Pfeiffer) que seria Eva, assim como seus filhos que acabam se agredindo como no episódio bíblico de Caim e Abel, além do bebê (Jesus) que é morto após ser oferecido por seu pai para a horda de devotos em uma cena que já figura entre as mais chocantes da história do cinema.
Há outras camadas em Mãe! e podemos observar como as mulheres são vistas e tratadas - graças ao talento do diretor nos sentimos na pele de Mãe - e a insensatez e fanatismo dos homens. O filme também une de certa forma ciência e religião ao mostrar o lar do casal ser destruído e recriado por Ele em um ciclo infinito que pode ser traduzido como o Big Bang, a explosão que deu origem ao universo e o Big Crunch, uma das hipóteses sobre o fim do universo que seria uma grande contração reunindo toda a matéria em um mesmo ponto e reiniciando o ciclo.
O desconforto e reflexões provocados por Mãe! são típicos das grandes obras de arte, cujo objetivo não é apenas deleitar a audiência mas causar incômodo, despertar novas ideias, conectar conceitos e quem sabe até mudar o modelo mental de quem a aprecia.
Nota: 5/5


Fabio Consiglio



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