Um filme por dia 2017 - 26/12 - As Pequenas Margaridas (1966)



Título original: Sedmikrásky
O filme tcheco As Pequenas Margaridas lembra uma instalação de arte audiovisual, colocando na tela imagens que evocam o surrealismo e a pop art com seus recortes e cores básicas, estética que remete ao cinema mudo e protagonistas que se protegem do mundo através de sua ingenuidade.
Duas jovens irmãs com o mesmo nome, Marie (Jitka Cerhová e Ivana Karbanová) encaram o mundo de forma ingênua e hedonista, desfrutando de bons restaurantes pagos pelos homens velhos que desejam seduzi-las sem nunca conseguirem, frequentando bares e boates e sempre comportando-se de maneira infantil, como se fossem crianças com corpos de mulheres. Cada novo plano que surge na tela apresenta alguma novidade: fotografia em preto-e-branco ou alguma cor básica, colagens em sequência enriquecendo a cena com novos significados, efeitos sonoros pontuando a ação de forma intensiva (o chamado Mickey Mousing). Não há um só momento de monotonia ao assistirmos As Pequenas Margaridas, mesmo se ignorarmos os seus signos.
Podemos interpretar As Pequenas Margaridas de forma localizada ou de forma mais universal. Na época da produção do filme a Tchecoslováquia (hoje República Checa) vivia sob domínio soviético e a obra pode ser vista como um reflexo do ambiente político que se preparava para a Primavera de Praga, quando liberais reformistas chegaram ao poder - logo seriam destituídos pelo Pacto de Varsóvia que invadiu o país. Sob um ponto de vista universal, qual seria o motivo de se levar a vida a sério frente a destruição, sofrimento e ignorância humana? Alguns podem irritar-se com a displicência no modo de viver das Maries, mas elas estão erradas ou estão errados todos os outros, com seus formalismos e condutas disciplinadas?
A vida humana é um breve lampejo que individualmente significa nada em termos planetários e coletivamente significa nada em termos cósmicos. Tendo isso em mente, não há motivos para acreditarmos que a vida tenha propósitos místicos ou motivações metafísicas. Como disseram as Maries: -Consegue sentir o cheiro? perguntou Marie II; -Do quê? respondeu Marie I; -De quão volátil é a vida!
Nota: 5/5


Fabio Consiglio



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